Comunicado da AGES sobre polêmica envolvendo Gabriel O Pensador 22/04/2012 /
AGES - Associação Gaúcha de Escritores
COMO SE FAZ UMA FEIRA DE LIVROS.
Gabriel O Pensador receberá, alardeia a mídia, 170 mil reais para ser patrono de uma feira de livro municipal. E aquilo que poderia ser visto como a valorização de um escritor apenas aponta para algo que já vem ocorrendo há muito tempo nas feiras de livro que povoam nosso estado: patronos midiáticos concedem maior possibilidade de que os meios de comunicação voltem seus holofotes para tais eventos. Alguns convidados ganham muitos, outros quase nada. Os motivos para tal diferenciação são os mais variados possíveis. Gabriel é, portanto, apenas mais um. Mas não o único a lucrar por ter sua figura mais explorada que aqueles que “apenas” escrevem. Gabriel canta, dança, produz shows, escreve livros. A maioria dos escritores, todavia, apenas escrevem. E, por só fazerem isso, não conquistam espaço nos programas de auditório da vida, e por só fazerem isso, não recebem cachês milionários. Ao contrário. Não estranha que Gabriel cobre 170 mil para ser homenageado. Cada um cobra o que quer pelo seu trabalho. O problema maior é quem paga uma exorbitância, a fim de que seu município possa ficar sob os holofotes.
Quem dera as feiras se preocupassem em formar leitores, quem dera verbas públicas remunerassem escritores, mas também abastecessem as bibliotecas municipais, escolares e familiares com livros. Só assim estaríamos formando uma geração mais leitora. Todavia, criar cidadãos-leitores não fará com que todos vibrem, cantem e dancem. A literatura não é tão bombástica; é mais silenciosa, menos espetacular. Há uma tremenda inversão de valores. A prática contradiz os objetivos. Escritores existem aos montes. Muitos deles com capacidade para atrair a atenção dos frequentadores de uma feira de livro, fazendo-os, através de depoimentos de vida e de leitura, potencializar desejos de mais e mais livros. É isso que deveria se pretender quando se resolve realizar uma feira literária: não apenas vender livros ou oportunizar shows de grandes astros.
O contato entre autores e leitores, mediados pela leitura do livro (objeto que o poder público poderia adquirir com valores empregados em contratações de astros), é o que se deve promover. Esses encontros é que de fato poderão capacitar crianças, jovens e adultos para que possam desenvolver uma prática leitora crítica e libertária. Escritores, para quem ainda não sabe, são pessoas que escrevem. E, por escreverem, merecem o respeito de quem é um trabalhador da palavra, devendo, portanto, ser remunerado por isso. Uma remuneração digna, que passa, sem dúvida, pela aquisição de sua obra para que, de fato, um município possa, através de suas feiras de livro - mais do que propiciar momentos espetaculares - promover a leitura, finalidade maior de qualquer estadista que queira uma sociedade cidadã. Uma feira de livro se faz com leitores e com escritores.
Uma feira de livro se faz tratando seus contratados com igualdade. Uma feira de livro se faz destinando o dinheiro público ao seu objetivo maior: formar leitores; promover o acesso aos livros e a discussão em torno deles; qualificar mediadores de leitura através de oficinas, de palestras, de mesas-redondas. Uma feira de livro se faz com livros. É isso que a Associação Gaúcha de Escritores defende. E ponto.
Diretoria da AGES: Associação Gaúcha de Escritores
Postado por H
Nenhum comentário:
Postar um comentário