PASÁRGADA:
UTOPIA DA VIDA QUE PODERIA
“Estrela da vida inteira.
Da vida que poderia
Ter sido e não foi. Poesia,
Minha vida verdadeira.”
MANUEL BANDEIRA
Paulo Diniz, autor de canções como “Quero voltar para a Bahia”, “Ponha um arco-íris na sua moringa”, “Brasil, brasa, braseiro” de ritmo alegre presente também em diversas canções cantadas por Martinho da Vila, “O meu amor chorou” e uma adaptação feliz para “Peixe Vivo”, a trilha sonora de um popular presidente do Brasil, fez coisas profundas no universo da canção de poesia do país.
Musicou “E agora José?” do mineiro Carlos Drummond de Andrade. Ouvir nas rádios o compositor cantando “José” ampliou a consciência de um Brasil profundamente poético. Mas ele também colocou melodia num outro poema, de um poeta pernambucano, uma das grandezas do país.
Nascido no final do XIX no Recife, o autor de comoventes poemas foi um menino que viveu intensamente a infância na capital pernambucana.
Um de seus poemas “Evocação do Recife” vale por muitas aulas de geografia. Se a escola fosse diferente e se os professores pudessem voar, que maravilha trabalhar numa aula de geografia sobre Recife apenas esse poema que começa limpando o nome de Recife de comparações. Dá pra viajar em sala de aula.
Farto do lirismo bem comportado, Manuel Bandeira, que viveu uma vida limitada por causa da tuberculose, publicou seu primeiro livro de poesia imaginando-se à beira da morte. Afinal, a idéia da morte o acompanhou a vida inteira.
Sua obra composta em quartos de pensões é um dos maiores tesouros do idioma. Provavelmente seja o mais lindo poeta de almas do Brasil a enriquecer com seus poemas a sensibilidade nacional. Maravilhosas crônicas publicadas em vários jornais: muitas delas ouvidas no rádio encantaram o espírito brasileiro.
Morreu fisicamente com mais de 80 anos de idade, muito embora desde a juventude, ao contrair tuberculose, foi acompanhado pela morte. Mas sempre viveu intensamente por meio de seus poemas. A poesia foi a sua vida verdadeira.
Solitário e doente, ao completar oitenta anos ganhou o prêmio “Moinho Santista” no valor de cinco mil cruzeiros quando o jovem compositor Chico Buarque, poucos dias antes recebera um prêmio de cinqüenta mil cruzeiros pela composição “A Banda”.
Estrela solitária diante da força do vendaval da indústria cultural, o autor contemporâneo do modernismo foi homenageado por praticamente todos os poetas do seu tempo, inclusive pelo Carlos Drummond da Andrade, que para ele dedicou 21 poemas.
Poeta “bem triste de tantos ais”, sua contribuição gigantesca para a cultura nacional bem poderia ser conhecida com afinco por todos os estudantes do Brasil. Um bom começo seria ouvir a canção de Paulo Diniz.
Uma palavra que o poeta ouviu quando menino numa sala de aula. Memorizou-a, porém nunca teve a idéia verdadeira do lugar, até que um dia revelou aos leitores: Pasárgada é um lugar dentro da poesia.
Poema que fala de uma utopia. De um lugar imaginário, para onde o poeta poderia ir e ser feliz, onde poderia ter a mulher que queria na cama por ele escolhida.
Um lugar onde a vida seria uma aventura, onde ele poderia andar de bicicleta e até subir no pau-de-sebo. Tomar banho de mar, deitar na beira do rio.
Assim foi a sua utopia pelo compositor levada ao disco, a utopia repleta da vida não vivida, da vida que poderia ter sido, a vida do homem que queria que o seu último poema fosse terno dizendo as coisas mais simples e menos intencionais.
O Brasil é o país do orgulho e não sabe, tem Manuel Bandeira e às vezes se esquece.
MARCIANO VASQUES
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