quinta-feira, 23 de setembro de 2010

SP: Quintas (27)

O PEREGRINO E O TEMPO


Certas coisas mudaram muito nos últimos anos. O "catecismo" era o máximo que podia almejar um jovem adolescente. Hoje, com a democratização da cultura, todos e quaisquer podem acessar. Viva o acesso! O importante é ter o acesso. Quem não acessa está fora. A Internet está aí e vídeos de sexo e também de perversidades estão disponíveis. Além de milhares e milhares de poetas na blogosfera. A internet é um mundo.

Ali perto do pátio do colégio, marco da fundação de São Paulo, havia um cinema que foi morrendo aos poucos, agonizando, descendo a ladeira, não a da memória, que para isso agora temos o Youtube. O cinema chamava-se Texas, e para sobreviver só passava filmes pornôs. À época se dizia filmes de sexo. Sexo. Correto?

Em minhas solitárias andanças pelas calçadas de Sampa, antes de "Sampa", trançando sonhos famintos e desorientados, sentia uma enorme alegria em ler os cartazes do cinema. A felicidade para mim nunca foi tão exigente, e sempre esteve presente nas pequenas coisas, como a leitura, em tardes ensolaradas, das aventuras do "Espírito" de Lee Falk, ou vagar pelas calçadas solitárias da cidade (Que saudades!)... E agora a solidão é diferente, eu diria: conectada. Estou novamente no meio da multidão.

A minha esperança são as distâncias. Como amo qualquer distância!

Hoje contemplo com mais discernimento as coisas que passam, o acesso geral e irrestrito, a desvalorização cada vez maior da mulher, a exacerbação da covardia, a surdez, a mudez, a música se esfarelando...Tem gente arquivando mil, duas mil, milhares de músicas. Juro! Tem coleções de amigos no Orkut, a batida do Funk povoando as mentes dos jovens sem suporte. Os acordos espúrios, os acordes ausentes...

E eu, onde quer que seja, tamborileiro solitário, tentando compreender, sem equacionar, o silencioso veneno do coito dos sentimentos que afloram nos grupos, nos coletivos. Porém, nenhuma insensatez há de vingar.

O azul é o mesmo, a tarde se espreguiça longamente pelo tempo das coisas que se vão, e talvez um girassol bastaria, quiça uma palavra surgiria para me acalmar, e diria: Maraci!, como quis a voz do vento, da ventania, dos vendavais, da brisa, do sopro, das ondas ensolaradas que as mulheres quaravam.

MARCIANO VASQUES

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