Capítulo VIII
O sol logo se esconderia horizonte abaixo e Heitor estava alerta aos ruídos e cheiros ao redor. A chuva expulsara os pequenos seres que vivem debaixo da terra; isso era uma festa para as aves, porque vinham comer os bichinhos, e para o lobo-guará, porque podia caçar as pequenas aves.
Filomena, – esse era o nome da onça-pintada –, estava pelas redondezas. Só quando escurecesse de uma vez ela iria atrás do seu jantar. Há algum tempo descobrira um lugar onde havia comida pronta. Vinha por aquela passagem no rio e entrava pelos grandes campos que se estendiam até bem longe. Avançava entre as hastes longas e amareladas, rastejava e espreitava, quando estava nos lugares mais ralos, sempre na direção dos humanos onde as caças que podiam matar a sua fome ficavam presas. Era uma caçada fácil, mas arriscada; os animais percebiam sua aproximação, ficavam alvoroçados e faziam barulho, pois não tinham por onde escapar. Os humanos sabiam que ela estava por perto e podiam inverter tudo. Nesse caso ela, Filomena, a onça-pintada mais bonita, mais veloz e mais valente daquela região, é que seria Ainda assim, não foi o seu assalto, roubando os animais da fazenda que criou toda a confusão...Chegara a época da colheita e as máquinas já estavam preparadas, os homens contratados. Os humanos sabiam que havia algum animal grande nas redondezas, atacando o galinheiro. Por isso, saíram armados para o trabalho na manhã seguinte.
Atiraram logo que avistaram Filomena, que dormia refestelada com a refeição da noite. Ela saiu correndo, escapando sem ser ferida, numa carreira e numa velocidade que lhe davam muita vantagem sobre os homens. Embora não tivesse feito amizade com Heitor, quando passou por ele, antes de desaparecer na direção do rio, deu uma paradinha e se lembrou de avisar:
– Fuja, novato. Este lugar não é mais seguro para se viver. Você está em perigo!
Heitor vacilou um pouco, sem entender bem o que acontecera. Mas não demorou muito e ele sentiu um cheiro estranho, desconhecido.
Depois ouviu um barulho, como o estalo de um galho quebrando,Ouviu um tropel, depois mais outro estalo e mais outro.
– Perigo! – pensou. Isso é perigo! – avisou seu instinto.
E saiu correndo, ziguezagueando na direção que fosse o mais longe possível daquilo que parecia estar cada vez mais perto. Escapou da perseguição, mas continuou correndo por um bom tempo, mesmo depois que atravessou o braço de rio e chegou aos campos queimados.
A chuva fora pouca e não houvera tempo para renovação; não era possível encontrar abrigo ou alimento.
Ficou rodando por ali os dois dias seguintes. Só encontrava os cupinzeiros, mas não precisava deles, porque sem o capim podia avistar até bem longe, se houvesse alguma coisa para ver, mas não havia.
Nilza Azzi - escritora associada da AEILIJ regional SP
Desenho de Davi Eliader Januário de Souza
EE Pio XII - Araxá. MG
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