Bartolo-nosso
por Leo Cunha
Segunda, 16 de Janeiro de 2012
Bartolomeu não era meu, era nosso. De todo mundo que ama a poesia, a literatura, a leitura, a memória, o ensino, o encanto. Mas no início dos anos 80, eu tinha a impressão de que ele era só meu.
Ele tinha publicado dois livros no início da década de 70 ("Pedro" e "O peixe e o pássaro"), mas os livros tinham saído de catálogo e desapareceram do mapa durante anos. Aí, em 1980, minha mãe fundou a Editora Miguilim e seu primeiro passo foi recuperar essas duas obras primas do Bartolomeu.
Foram os primeiros de mais de 10 livros do Bartô que eu tive a sorte de ver nascendo e crescendo. Ciganos, Cavaleiros das Sete Luas, Correspondência, Indez, As patas da vaca e outros tantos. Eu estava entrando na adolescência e pude acompanhar (de intrometido que sempre fui) o processo de ilustração, de editoração, de lançamento.
Além disso, eu passava todas as minhas tardes na Miguilim (que, além de editora, era uma "casa de leitura e livraria") e o Bartô passava por lá quase todo dia, ou pelo menos foi assim que a minha memória guardou, num ato rebelde de bartolomice.
Quando comecei a escrever, ele foi uma influência clara, descarada. Meu "O sabiá e a girafa" deve um bocado a "O peixe o pássaro". Meu "Gato de Estimação" segue os passos da "História em 3 atos".
Meu estilo, se é que algum dia consegui chegar perto disso, foi fermentado numa mistura do lirismo e do "memorialismo" do Bartolomeu com o humor e o nonsense de outros dois escritores que também foram embora cedo demais: os saudosos Sylvia Orthof e José Paulo Paes.
Muitos anos depois, tive a honra de dividir com o Bartô dois livros: o infantil "Olhar de bichos" e o teórico "O que é qualidade na literatura infantil e juvenil". Além de muitas conversas em lançamentos, feiras de livros, aeroportos, onde quer que a literatura infantil leve a gente. Levava.
Como o seu personagem Pedro, o Bartô foi embora com o coração cheio de domingo. Mas os livros ficam pra todos os dias.
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