A história de Heitor
Capítulo VI
Rio acima, um dos cães adoeceu e morreu. As crianças ficaram muito tristes. Enterraram-no num lugar um pouco afastado da casa, junto a um pé florido de cega machado.
Chuva nenhuma caía do céu; o lavrador começou a cortar o capim que juntou num monte no meio de uma área que depois iria plantar Quando chegou a hora do almoço, amontoou algumas pedras e fez um fogo para aquecer a sua marmita...
Na hora do sol mais quente, o capim começou a arder. O fogo espalhou-se. O vento soprava na mesma direção por onde escorriam as águas: – rio abaixo. Quem teve tempo de fugir... fugiu, mas foram poucos; apenas os mais ágeis, os maiores, algumas aves, antes da fumaça espalhar-se, os que não ficaram encurralados em algum canto. As labaredas, ainda não muito altas, consumiam toda a vegetação rasteira, arbustos e gramíneas, capim e flores, e chamuscavam o tronco das árvores. Os troncos grossos e cascudos eram a sua proteção. As mais baixas queimavam mais, perdiam galhos e folhas; as mais altas resistiam melhor, ficando apenas com os troncos enegrecidos. O fogo foi correndo os campos, estalando, aproximando-se das margens do rio, cessando ali, onde começava a areia e nada mais havia a alimentá-lo. Samantha, naquele dia, havia se desenroscado da sucupira e deslizado para o rio. Os lobos estavam perto de seu abrigo, sempre sob a supervisão de Lorena. Mercúrio não estava nas redondezas; afastara-se para caçar...
Primeiro a loba, depois até mesmo os filhotes, ouviram os estalidos, sentiram o cheiro de fumaça e se assustaram.
– Fogo! – avisou Lorena – Vamos sair daqui depressa! Para o rio!
Mas quando se aproximaram da margem avistaram Samantha logo abaixo. Assustados, Hunter e Horácio correram em outra direção, seguidos por Lorena que procurava orientá-los...
Heitor, porém, mais valente e destemido, pulou para a areia e de lá para uma pedra, e de lá para outra... E continuou pulando e correndo até que encontrou uma reentrância no barranco, um lugar fresco e fora do alcance do fogo e da sucuri. Um longo tempo passou até que esfriasse um pouco e Heitor tivesse coragem de sair do seu abrigo. Ele subiu o barranco e, até onde podia ver, além de algumas árvores esparsas, nada restara dos prados a que estava acostumado. Ele voltou para a margem, bebeu água e conseguiu achar um pequeno molusco grudado numa pedra. Apurou os ouvidos, o olfato e andou um pouco pela margem para cima e para baixo; ele procurava por Lorena e pelos outros filhotes, mas não havia sinal deles. Foi até o alto mais uma vez. O solo ainda estava quente, mas ele caminhou pelas beiradas, negras como suas patas. Procurou mais um pouco. Nada! Com o rabo entre as pernas, voltou para o abrigo e passou sua primeira noite sozinho.
Nilza Azzi
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