UM CERTO COELHO ENTRE NÓS
Muitos personagens povoam as mentes infantis. Geralmente derivados das Histórias em Quadrinhos e popularizados nos vespertinos da televisão.
Uma boa parte não acrescenta nada à criança. Só perseguições, pancadarias, espertezas, safadezas, bobagens e coisas sem sentido e muitas vezes sem lógica. É pássaro levado que está sempre brigando e levando a melhor, é gato perseguindo rato. Enfim. E tem coelho que também nada diz.
Entretanto, hoje resolvi falar de um coelho especial. Visto que no espaço lúdico da criança o coelho triunfou, por causa de sua graciosidade, e pela sua fertilidade até se tornou um símbolo da Páscoa, para glória e alegria do comércio de chocolate.
Bem disse a Clarice: toda criança deveria pelo menos uma vez na vida ter um coelho. Eu conheci, tu conheceste, um em nossa infância. E não dá para falar dele sem falar da sua dona, ou seja, da sua criadora. Encanto de vida.
Algumas vidas realmente me enfeitiçam. Espinosa, e ela, Beatrix Potter, a criadora de Peter Rabbit. Genial. Uma doçura. E viveu numa época difícil para a mulher. Podemos vasculhar e pesquisar um dia inteiro na busca de encontrar uma época que tenha sido fácil para a mulher, mas ela nasceu no século XIX e viveu uma parte do século XX. Morreu em 1943.
Época em que mulher não podia trabalhar, e menos ainda ser autora de Literatura Infantil. Ser independente? Nem pensar! Mas ela foi, o seu espírito era independente, talvez por ter convivido em toda a sua vida com os animaizinhos, entre os quais, os coelhos, e ter sido uma grande e incansável observadora e, um detalhe, atenciosa para com os pequenos seres que vivem ao redor da infância. Ela era diferente e destoava de sua época. Amava os animais e até conversava com eles. Por isso seus personagens doces e sensíveis conquistaram o coração da criança em todos os lugares. Criança é universal, pertence a todos os lugares. Escritores que perceberam isso, escreveram obras inesquecíveis.
Peter Rabbit. De vez em quando nós o vemos em sacolas. Mas ele foi o personagem travesso e encantador da obra mais famosa de Beatrix Potter.
Numa época preconceituosa contra a mulher, a autora e ilustradora procurou setenta editoras para tentar publicar o seu primeiro livro. Todas recusaram, pois era difícil naqueles dias para um principiante, um autor desconhecido publicar um livro. As editoras recusavam, e em se tratando de mulher...
Em 1902 seu coelho Peter foi publicado. A septuagésima editora aprovou.
Começou a ganhar dinheiro com a venda de seus livros e se tornou próspera, pois bem dizem, coelho dá sorte, por isso que uma certa ignorância prevaleceu durante muito tempo por aí, de se cortar a pata do coelho e, talismã!
Vamos só nas coisas amenas.
Contrariando o espírito dominante da época, ela não queria se casar, mas uma mulher era feita para casar, e era inaceitável para a família uma componente de feminino ganhando dinheiro com seus próprios livros. Que barra! A inglesa Beatrix sofreu, mas jamais desistiu de seu ideal. E emocionou os corações dos pequenos com seu extraordinário coelho.
Dizem que J.K. Rowling deu o sobrenome do seu bruxo porque ela adorava a autora de Peter Rabbit, mas por enquanto, é só boato.
Não só os seus coelhos, mas todos os seus personagens animais têm vida, e bota vida, menino! E têm muita alma.
Ela chocou a sociedade e depois a encantou com seu coelho. Nada mais justo que seja lembrada. E viva Peter Rabbit!
Quer uma vida de beleza? De luta e determinação? Siga essa mulher, a maior escritora de literatura infantil do mundo e de todos os tempos. E abrace o seu coelho.
Marciano Vasques
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