Marciano Vasques
A MÚSICA NO CORAÇÃO DO TEMPO
Em 1971 Taiguara fez uma canção e por ela me apaixonei. Amanda ajudou a ilustrar a minha adolescência. Talvez não fosse eu já mais adolescente, mas ainda sentia as dores de sê-lo, que é aberto sempre estar para as dores do mundo receber.
Ouvi Amanda com Taiguara, com Antonio Marcos. É uma das canções responsáveis por um modo de ser de uma parte da juventude no início da década de setenta.
A Música realmente conduz as pessoas.
Ela é responsável por modelar, amortecer, entorpecer ou elevar as almas. A sua força é inconteste. E bem sempre souberam os exércitos e as religiões. E a música de letra reflete o coração do tempo. Nunca esqueci de Amanda, um jeito extraordinariamente poético de viver e sentir, que nos era por Taiguara oferecido na voz de um jovem cantor de São Miguel Paulista nos dias em que sobre as pessoas tinha o rádio uma força inimitável.
É compreensível que a canção que trouxe a poesia para a minha existência - a música de letra que esteve mais próxima da poesia - tenha sido a responsável pela adesão poética imediata ao trabalho de Caetano Veloso tempos depois. E os pioneiros, entre os quais Taiguara e Antonio Marcos, não podem ser desprezados.
No tempo em que ainda não havia uma separação tão abismal entre a poesia e a letra de música, e os versos tinham uma importância que parecia insuperável, os pioneiros posteriormente de brega ou coisa assim chamados, revelavam uma face em que as marcas no caminho talvez apagadas não pudessem ser.
Hoje canções como Balada de Agosto de Fagner e Zeca Baleiro ajudam a preservar no universo musical a necessidade da poesia.
Aplausos e compreensão merecem os cantores que edificam pontes entre as produções poéticas de qualidade intelectual e o popular. Muitos não têm consciência de sua própria importância, outros com habilidade entre universos diferentes trafegam, como Caetano, que é feliz na gangorra que construiu e vai e vem entre Guimarães Rosa e a mídia, da qual extrai mais do que o suficiente para a sua necessidade interior.
Enquanto observo a felicidade de algumas crianças da EMEF Jardim Vila Nova num entardecer chuvoso, penso no quanto a música foi, a partir de um momento, responsável pela construção do homem que sou...
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