sábado, 21 de julho de 2012

SP: Página do Rospo (10)

NÃO SE TRATA DE NOSTALGIA



—Rospo, você é saudosista? É nostálgico? Vive em nostalgia?
—De modo algum...
—Mas vive valorizando as coisas boas do passado. Para você o passado é um lugar onde tudo era melhor, era encantador, e maravilhoso.
—Absolutamente não, Sapabela. Estou adorando essa sua provocação. Ocorre que recentemente alguém me disse algo assim, que não se trata de nostalgia: é que os referenciais ainda são muito bons.
—Sei, quando você fala de Taiguara, do “Espírito -que-anda”, do Fellini, da Gigliola...
—Gigliola ainda vive.
—Isso não importa aqui, pois a referência é a sua voz e as suas canções...
—Sei.
—Então, os referenciais ainda são bons?
—Os melhores, ainda. Então, não se trata de passado, de nostalgia, mesmo porque nesse caso o tempo é apenas uma ilusão, uma questão de ótica, compreende? Uma quimera.
—Quimera?
—Sim, Cronos não atua nessas recordações... Pois elas estão fora do tempo. Uma canção que nos conquistou pela sua beleza e pela sua mensagem, que nos foi capaz de invadir o nosso coração, não é de ontem, não pertence ao passado. Tem sapo que diz, de forma boba, que tal coisa é do passado. Isso é do Passado, e debocha, e alguns até leem livro de 2000 anos... O passado não existe para a Arte...
—Certamente. Mas disse algo curioso: que nem tudo no passado era ou foi encantador e maravilhoso...
—Bem sabe, amiga. Em termos mundiais, guerras, e em nosso brejo, muito sofrimento, a exploração dos operários, os preconceitos contra a sapa, as injustiças, tanta coisa...Mas tivemos a Arte, como sempre a teremos...
—E na sua infância, Rospo? Tudo uma maravilha...
—Sabe que não, Sapabela, mas tive os meus reforços, os meus apoios, os meus mecanismos de defesa interior...
—Sempre fala nisso. Mas já sei, o Flash Gordon o salvou...
—Não só ele... Mas, também o próprio contato com a natureza, as folhagens, o velho orvalho deslizando na lisa folha...
—Tem algo triste que o marcou profundamente? Que tenha causado uma profunda impressão em seu ser?
—Quando eu era um sapinho de seis anos, ou cinco... Vi uma cena que me influenciou para o resto de minha vida...
—Expressão esquisita essa, meu amigo! O “O resto de minha vida”...
—É, estranho... Pois é, algo me causou a mais viva impressão...
—Se não quiser falar...
—Vi um cavalo deitado no chão, sendo chicoteado até...
—Não precisa falar mais, Rospo. Pare! Não quero chorar. Mas é incrível essa coisa que você diz de que tinha os seus recursos...
—Maravilhosos, Sapabela. Uma contadora de histórias... Sim, tive uma em casa, os quintais, tudo contribuindo para a prolongação de meu trapiche interior... Para a proteção de minha infância...
—Rospo, podemos dizer que o que era bom ainda é bom, mesmo que a geração atual desconheça?...
—Em nossos dias tão refinados de informação, o desconhecimento é um assombro...
—Deveríamos voltar à época do espanto?
—Sim, espanto no sentido de encanto... Hoje, coisas extraordinária acontecem, mas o encanto não se mobiliza, não se torna forte, real, autêntico. Ele se dissolve no ar... Morre na praia do coração.
—Rospo, então vamos viver o presente intensamente, mas com as coisas que sempre nos comoveram...
—Esse é o caminho, e também compartilhando o que hoje se faz importante no coração...
—Considera que a Rede Social é mesmo a sinalização de um novo tempo?
—Claro, eu posso estar na Rede Social com os espíritos mais encantadores do mundo hoje...A Rede Social, eu já disse, depende de cada um.
—Disse bem. Rospo, a conversa está boa mas não está regada.
—Regada?
—É, um licorzinho, você sabe...
—Demorou!
—Não fez o Yupiiii!
—Não fiz?
—É... Consegue fazer baixinho?
—Yupiiii!
—Isso é baixinho, Rospo?

MV

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